No primeiro dia cheguei cedo demais
No primeiro dia cheguei cedo demais, com receio de perder o que nem tinha começado.
O medo era de não saber onde eram as salas, não saber com quem falar, não saber se ia gostar.
Sem me aperceber, o labirinto passou a ser rotina.
Quase extensão da minha própria intuição.
As canções nos corredores já sabia de cor(po) e alma.
Os rostos conhecidos, repetidos.
Fazia parte de algo maior do que eu própria.
Algo que era casa, era palco, era libertação.
Onde “o médico que só sabe medicina, nem medicina sabe” foi personificação.
Aprendi que crescer não vem com permissão.
Errar deixou de ser receio e passou a ser certeza.
E esta casa, que aos meus olhos não tinha defeitos?
Ao dar um passo atrás vi-a como um espelho imperfeito.
Apesar de ter a mudança em mente,
encontrei muitas vezes um espaço que teimava a ser o mesmo, sempre.
Os tempos foram mudando
Os rostos conhecidos já são escassos
As canções nos corredores ainda ecoam
Mas com outras vozes, com novos compassos.
É estranho sentir-me visita
Num lugar que já foi como um véu
Um sentimento agridoce, mas inevitável
Do “meu” ICBAS já não ser assim tão meu
E agora?
Tenho uma sensação peculiar. Quase ingrata - mas não é. É só real.
Depois de anos a sofrer com a antecipação do eventual “fim”,
Ninguém nos diz que se calhar o mais difícil é aceitar que chega uma altura em que o ansiamos.
Já sei onde são as salas, já sei com quem contar, já sei do que gosto e o que ficou por me conquistar.
Mas algo me diz que, mesmo no último dia, também vou chegar cedo demais.
Só que desta vez vai ser para saborear a beleza escondida do fim.
Já dei tudo o que tinha para dar. E talvez por isso mesmo esteja pronta para ir.


por Ricardo Luís


Associação de Estudantes do Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar da Universidade do Porto
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